domingo, 21 de setembro de 2014

A ESCRAVIDÃO DA DÍVIDA É A EVOLUÇÃO DA ESCRAVIDÃO PELA DÍVIDA

A escravidão da dívida –
Porque ela destruiu
Roma e porque nos
destruirá se não for
travada
por Michael Hudson

O Livro V da Política, de Aristóteles, descreve
a eterna transição de oligarquias que se
transformam a si próprias em aristocracias
hereditárias – as quais acabam por ser
derrubadas por tiranos ou desenvolvem
rivalidades internas quando algumas famílias
decidem "trazer a multidão para o seu campo"
e introduzir solenemente a democracia, dentro
da qual mais uma vez emerge uma oligarquia,
seguida por aristocracia, democracia e assim
por diante ao longo da história.
A dívida tem sido a dinâmica principal que
conduz estas mudanças – sempre com novas
reviravoltas. Ela polariza riqueza para criar
uma classe credora, cujo domínio oligárquico
é finalizado quando novos líderes ("tiranos"
para Aristóteles) ganham apoio popular
através do cancelamento de dívidas e
redistribuição da propriedade ou pela
captação do seu usufruto para o estado.
Desde o Renascimento, contudo, banqueiros
transferiram seu apoio político para
democracias. Isto não reflectiu convicções
políticas igualitárias ou liberais, mas antes
um desejo de melhor segurança para os seus
empréstimos. Como explicou James Steuart
em 1767, contratações de empréstimos da
realeza permaneciam assuntos privados ao
invés de dívidas verdadeiramente públicas.
Para que dívidas de um soberano se
tornassem vinculada a todo o país,
representantes eleitos tinham de aprovar
impostos para pagar os encargos de juros.
Ao dar aos contribuintes esta voz no governo,
as democracias holandesa e britânica
proporcionaram aos credores muito mais
segurança de pagamento do que as que
tinham com reis e príncipes cujas dívidas
morriam consigo. Mas os recentes protestos
da dívida da Islândia à Grécia e à Espanha
sugerem que os credores estão a transferir o
seu apoio para longe de democracias. Eles
estão a exigir austeridade fiscal e mesmo
privatizações baratas.
Isto é uma viragem da finança internacional
para um novo modo de guerra. O seu
objectivo é o mesmo das conquistas militares
de tempos passados: apropriar-se de recursos
minerais e territoriais, assim como da
infraestrutura pública, e extrair tributos. Em
resposta, democracias estão a exigir
referendos sobre se pagam a credores através
da liquidação do domínio público e aumentos
de impostos para impor desemprego, salários
em queda e depressão económica. A
alternativa é reduzir dívidas ou mesmo anulá-
las, e reafirmar o controle regulador sobre o
sector financeiro.
Governantes do Médio Oriente proclamavam
tábuas rasas para devedores a fim de preservar
o equilíbrio económico
A cobrança de juros sobre avanços de bens
ou dinheiro originalmente não se destinava a
polarizar economias. Administrados a
princípio no terceiro milénio AC como um
acordo contratual entre templos e palácios
sumérios com mercadores e empresários que
tipicamente trabalhavam na burocracia real,
supunha-se que o juro a 20 por cento
(duplicando o principal em cinco anos) se
assemelhasse a uma fatia razoável dos
retornos do comércio a longa distância ou do
arrendamento de terra e outros activos
públicos tais como oficinas, barcos e casas de
bebidas alcoólicas.
Como esta prática foi privatizada pelos
cobradores reais de licenças de uso e de
rendas, a "divina majestade" protegia
devedores agrários. As leis de Hammurabi
(1750 AC) cancelavam suas dívidas em
tempos de enchentes ou de seca. Todos os
governantes da sua dinastia na Babilónia
principiavam o seu primeiro ano no ano com
o cancelamento de dívidas agrárias de modo
a remover pagamentos atrasados através da
proclamação de uma tábua rasa (clean slate).
Direitos sobre escravos, terra ou colheitas e
outros compromissos eram devolvidos aos
devedores para "restaurar a ordem" numa
idealizada condição "original" de equilíbrio.
Esta prática sobreviveu no Ano Jubileu da Lei
Mosaica em Leviticus 25.
A lógica era bastante clara. Sociedades
antigas precisavam por exércitos em campo
para defender a sua terra e isto exigia libertar
cidadãos endividados da servidão. As leis de
Hammurabi protegiam carroceiros e outros
combatentes de serem reduzidos à servidão
da dívida e impediam credores de tomarem as
colheitas de arrendatários das terras reais e
de outras terras públicas e ainda da terra
comunal que devia [fornecer] mão-de-obra e
serviço militar ao palácio.
No Egipto, o faraó Bakenranef (720-715 AC,
"Bocchoris" em grego) proclamou um amnistia
da dívida e aboliu a servidão da dívida
quando confrontado com uma ameaça militar
da Etiópia. De acordo com Diodorus da Sicília
(I, 79, escrevendo em 40-30 AC), ele
determinou que se um devedor contestasse a
pretensão, a dívida era anulada se o credor
não pudesse apoiar a sua pretensão através
de um contrato escrito (parece que os
credores sempre tiveram inclinação a exagerar
o saldo devido). O faraó raciocinou que "os
corpos dos cidadãos deveriam pertencer ao
estado, a fim de que ele possa dispor dos
serviços que os seus cidadãos devem prestar-
lhe, tanto em tempos de guerra como de paz.
Portanto ele sentiu que seria absurdo para um
soldado ... ser arrastado para a prisão pelo
seu credor devido a um empréstimo não pago,
e que a cobiça de cidadãos privados assim
poria em perigo a segurança de todos".
O facto de os principais credores do Médio
Oriente serem o palácio, templos e seus
cobradores tornava politicamente fácil
cancelar as dívidas. É sempre fácil anular
dívidas devidas a si próprio. Mesmo
imperadores romanos queimaram os registos
de impostos para impedir uma crise. Mas era
muito mais difícil cancelar dívidas devidas a
credores privados quando a prática de cobrar
juros difundiu-se às tribos do Mediterrâneo
ocidental após cerca de 750 AC. Ao invés de
permitir a famílias colmatarem fossos entre
rendimento e despesa, a dívida tornou-se a
principal alavanca da expropriação de terra,
polarizando comunidades entre oligarquias
credoras e clientes endividados. Em Judá, o
profeta Isaias (5:8-9) condenou arrestos por
parte de credores os quais "acrescentavam
casa a casa e juntavam campo a campo até
que nenhum espaço fosse deixado e você
vivesse solitário na terra".
O poder do credor e o crescimento estável
raramente andaram juntos. A maior parte das
dívidas pessoais neste período clássico eram
o produto de pequenas quantias de dinheiro
emprestadas a indivíduos a viverem à beira
da subsistência e que não podiam sustentar-
se. O confisco de terra e activos – e da
liberdade pessoal – forçava devedores à
servidão que se tornava irreversível. Por volta
do século VII AC, "tiranos" (líderes populares)
emergiram para derrubar as aristocracias
Corinto e outras ricas cidades gregas,
ganhando apoio pelo cancelamento de
dívidas. De um modo menos tirânico, Sólon
fundou a democracia ateniense em 594 AC ao
banir a servidão da dívida.
Mas ressurgiram oligarquias e exigiram
pagamento em Roma quando os reis Agis e
Cleómenes de Esparta, e seu sucessor Nabis,
quis cancelar dívidas no fim do terceiro
milénio AC. Eles foram mortos e os seus
apoiantes expulsos. Tem sido uma constante
política da história, desde a antiguidade, que
interesses de credores se oponham tanto à
democracia popular como ao poder real capaz
de limitar a conquista financeira da sociedade
– uma conquista destinada ligar pretensões a
dívidas portadoras de juros ao pagamento de
tanto quanto possível do excedente
económico.
Quando os irmãos Graco e os seus seguidores
tentaram reformar as leis do crédito em 133
AC, a classe senatorial dominante actuou com
violência, matando-os e inaugurando um
século de Guerra Social, resolvida pela
ascensão de Augusto a imperador, em 29 AC.
A oligarquia credora de Roma vence a Guerra
Social, escraviza a população e provoca uma
Época de Trevas
As coisas foram mais sangrentas no exterior.
Aristóteles não mencionou a construção do
império como parte do seu esquema político,
mas a conquistas estrangeira sempre foi um
factor importante na imposição de dívidas e
as dívidas de guerra sempre foram a principal
causa da dívida pública em tempos modernos.
A mais rude imposição de dívida da
antiguidade foi a de Roma, cujos credores a
difundiram para assolar a Ásia Menor, sua
província mais próspera. A regra da lei quase
desapareceu quando chegaram os "cavaleiros"
colectores de impostos. Mitríades de Pontus
levou a três revoltas populares, populações
locais em Efeso e outras cidades levantaram-
se e mataram 80 mil romanos em 88 AC. O
exército romano retaliou e Sila impôs um
tributo de guerra de 20 mil talentos em 84
AC. Encargos por juros atrasados
multiplicaram esta soma em seis vezes por
volta de 70 AC.
Dentre os principais historiadores de Roma,
Lívio, Plutarco e Diodorus atribuíram a queda
da República à intransigência dos credores ao
travar a Guerra Social de um século marcada
pelo assassínio político de 133 a 29 AC.
Líderes populistas quiseram ganhar adeptos
advogando cancelamentos de dívida (ex., a
conspiração de Catilina em 63-62 AC). Eles
foram mortos. Por volta do segundo século
DC cerca de um quarto da população estava
reduzida à servidão. No século V a economia
de Roma entrou em colapso, despojada de
dinheiro. A subsistência regrediu ao mundo
rural.
Credores encontram uma razão legalista para
apoiar a democracia parlamentar
Quando a banca recuperou-se depois de as
Cruzadas saquearem Bizâncio e injectarem
prata e ouro para ressuscitar o comércio da
Europa Ocidental, a oposição cristã à
cobrança de juro foi ultrapassada pela
combinação de prestamistas prestigiosos (os
Cavaleiros Templários e Hospitalários que
proporcionaram crédito durante as Cruzadas)
e seu principais clientes – reis, primeiro para
pagar a Igreja e cada vez mais para travar a
guerra. Mas dívidas reais ficavam inválidas
quando morriam reis. Os Bardi e Peruzzi
foram à bancarrota em 1345 quando Eduardo
III repudiou suas dívidas de guerra. Famílias
banqueiras perderam mais com empréstimos
aos Habsburgo e Bourbon, déspotas nos
tronos de Espanha, Áustria e França.
As coisas mudaram com a democracia
holandesa, que procurava ganhar e assegurar
a sua liberdade dos Habsburgo da Espanha. O
facto de que o seu parlamento estava a
contratar dívidas públicas permanentes por
conta do estado permitiu aos Países Baixos
levantar empréstimos para empregar
mercenários numa época em que dinheiro e
crédito eram o dinheiro para o financiamento
da guerra. O acesso ao crédito "era
consequentemente a mais poderosa arma na
luta pela sua liberdade", escreveu Richard
Ehrenberg em seu Capital and Finance in the
Age of the Renaissance (1928): "Alguém que
desse um crédito a um príncipe sabia que o
reembolso da dívida dependia apenas da
capacidade e vontade de pagar do devedor. O
caso era muito diferente para as cidades, as
quais tinham poder como soberanas, mas
eram também corporações, associações de
indivíduos mantidos em vínculo comum. De
acordo com a lei geralmente aceite cada
burguês individual era responsável pelas
dívidas da cidade tanto com a sua pessoa
como com a sua propriedade".
O feito financeiro do governo parlamentar foi
portanto estabelecer dívidas que não eram
meramente obrigações pessoais de príncipes,
mas eram verdadeiramente públicas e
vinculativas sem importar quem ocupasse o
trono. Eis porque as duas primeiras nações
democráticas, a Holanda e a Grã-Bretanha
após a sua revolução de 1688, desenvolveram
os mercados de capital mais activos e
progrediram até tornarem-se as principais
potências militares. O irónico é que foi a
necessidade de financiamento de guerra que
promoveu a democracia, formando uma
trindade simbiótica entre fazer guerra, crédito
e democracia parlamentar que perdurou até os
dias de hoje.
Nesta época "a posição legal do Rei enquanto
tomar de empréstimos era obscura e ainda
era duvidoso que os seus credores tivessem
qualquer remédio isso em caso de
incumprimento" (Charles Wilson, England's
Apprenticeship: 1603-1763: 1965). Quanto
mais despóticas se tornavam a Espanha,
Áustria e França, maior a dificuldade que
encontravam para financiar as suas aventuras
militares. No fim do século XVIII a Áustria foi
deixada "sem crédito e, consequentemente,
sem muita dívida", o país da Europa com
crédito menos valioso e o pior armado,
totalmente dependente de subsídios britânicos
e garantias de empréstimos no tempo das
Guerras Napoleónicas.
As finanças acomodam-se à democracia, mas
então pressionam pela oligarquia
Enquanto as reformas democráticas do século
XIX reduziram o poder das aristocracias
territoriais de controlar parlamentos,
banqueiros movimentaram-se com
flexibilidade para alcançar um relacionamento
simbiótico com praticamente toda forma de
governo. Em França, seguidores de Saint-
Simon promoveram a ideia de bancos a
actuarem como fundos mútuos, concedendo
crédito contra participação no lucro. O estado
alemão fez uma aliança com a grande banca
e a indústria pesada. Marx escreveu
optimistamente acerca de como o socialismo
faria as finanças produtivas ao invés de
parasitas. Nos Estados Unidos, a regulação de
empresas de serviços públicos (utilities)
andou de mãos dadas com retornos
garantidos. Na China, Sun-Yat-Sen escreveu
em 1922: "Pretendo por todas as indústrias
nacionais da China dentro de um Great Trust
possuído pelo povo chinês e financiado com
capital internacional para benefício mútuo".
A I Guerra Mundial assistiu os Estados Unidos
a substituírem a Grã-Bretanha como a
principal nação credora, e no fim da II Guerra
Mundial haviam açambarcado uns 80 por
cento do ouro monetário do mundo. Seus
diplomatas moldaram o FMI e o Banco
Mundial de acordo com linhas orientadas para
o credor que financiavam a dependência
comercial, principalmente dos Estados Unidos.
Empréstimos para financiar défices comerciais
e de pagamentos foram sujeitos a
"condicionalidades" que mudavam o
planeamento económico para oligarquias
clientes e ditaduras militares. A resposta
democrática aos planos de austeridade
resultantes que extorquiam o serviço da dívida
foi incapaz de ir muito além dos "tumultos
FMI", até que a Argentina rejeitou a sua dívida
externa.
Uma austeridade semelhante, orientada para
o credor, está agora a ser imposta à Europa
pelo Banco Central Europeu (BCE) e a
burocracia da UE. Ostensivamente, governos
sociais-democratas foram direccionados para
o salvamento de bancos ao invés de relançar
o crescimento económico e o emprego. Perdas
com empréstimos bancários apodrecidos e
especulações são levadas para dentro do
balanço público ao mesmo tempo que se
verificam reduções de despesas públicas e
mesmo liquidações de infraestruturas. A
resposta de contribuintes presos à dívida
resultante tem sido o aumento de protestos
populares, a começar pela Islândia e Letónia,
em Janeiro de 2009, e mais manifestações
generalizadas na Grécia e Espanha neste
Outono para protestar contra a recusa dos
seus governos a efectuar referendos sobre
estes salvamentos fatídicos de possuidores
estrangeiros de títulos.
A transferir o planeamento para banqueiros e
para longe de representantes públicos eleitos
Toda economia é planeada. Isto
tradicionalmente tem sido a função do
governo. Abdicar deste papel com o slogan
dos "mercados livre" deixa-a nas mãos de
bancos. Mas o planeamento que privilegia a
criação e distribuição de crédito torna-se
ainda mais centralizado do que aquele de
responsáveis públicos eleitos. E para tornar
as coisas piores, o período de tempo
financeiro habitual é o curto prazo, acabando
na venda de activos. Ao procurarem os seus
próprios ganhos, os bancos tendem a destruir
a economia. O excedente acaba por ser
consumido pelos juros e outros encargos
financeiros, não deixando receitas para novo
investimento de capital ou despesas sociais
básicas.
Esta é a razão porque abdicar do controle
político em favor de uma classe credora
raramente anda junto com o crescimento
económico e a elevação de padrões de vida. A
tendência para as dívidas crescerem mais
rapidamente do que a capacidade da
população para pagar tem sido uma
constante básica ao longo de toda a história
registada. As dívidas aumentam
exponencialmente, absorvendo o excedente e
reduzindo grande parte da população ao
equivalente da servidão da dívida. Para
restaurar o equilíbrio económico, o clamor da
antiguidade pelo cancelamento de dívida
procurava o que a Idade do Bronze no Médio
Oriente alcançou por decreto real: cancelar o
super-crescimento de dívidas.
Em tempos mais modernos, as democracias
têm pressionado um estado forte a tributar o
rendimento e a riqueza rentista e, quando
preciso, a reduzir (write down) dívidas. Isto é
feito mais prontamente quando o próprio
estado cria moeda e crédito. E é feito menos
facilmente quando bancos traduzem os seus
ganhos em poder político. Quando é permitido
aos bancos auto-regularem-se e lhes é dado
poder de veto sobre reguladores do governo, a
economia é distorcida para permitir aos
credores entregarem-se a jogos especulativos
e a fraude directa que assinalaram a última
década. A queda do Império Romano
demonstra o que acontece quando exigências
de credores não são controladas. Sob estas
condições a alternativa ao planeamento e
regulação governamental do sector financeiro
torna-se uma estrada para a servidão da
dívida.
Finanças versus governo; oligarquia versus
democracia
Democracia envolve subordinação da
dinâmica financeira a fim de servir o equilíbrio
e o crescimento económica – e tributação do
rendimento rentista ou manutenção de
monopólios básicos no domínio público. O
rendimento "livre" da propriedade não
tributada ou privatizada fica comprometido
com os bancos, a ser capitalizado em
empréstimos maiores. Financiada pela
alavancagem da dívida, a inflação dos preços
dos activos aumenta a riqueza rentista
enquanto endivida a economia como um todo.
A economia contrai-se, caindo em situação
líquida negativa.
O sector financeiro já ganhou influência
suficiente para utilizar tais emergências como
oportunidades para convencer governos de
que a economia entrará em colapso se eles
não "salvarem os bancos". Na prática isto
significa consolidar o seu controle sobre a
política, a qual eles utilizam de maneiras que
promovem a polarização das economias. O
modelo básico é o que ocorreu na Roma
antiga, movendo-se da democracia para
oligarquia. De facto, dar prioridade a
banqueiros e deixar o planeamento económico
ser ditado pela UE, BCE e FMI ameaça despir
o estado-nação do poder de cunhar ou
imprimir moeda e cobrar impostos.
O conflito resultante está a contrapor os
interesses financeiros à auto-determinação
nacional. A ideia de um banco central
independente ser "a característica da
democracia" é um eufemismo para abdicar da
mais importante decisão política – a
capacidade de criar dinheiro e crédito – em
favor do sector financeiro. Ao invés de deixar
a opção política a referendos populares, o
resgate de bancos organizado pela UE e BCE
representa agora a categoria máxima de
dívida nacional ascendente. As dívidas de
banco privados assumidas do balanço do
governo na Irlanda e na Grécia foram
transformadas em obrigações do contribuinte.
O mesmo é verdadeiro para os US$13 milhões
de milhões (trillion) da América acrescentados
desde Setembro de 2008 (incluindo US$5,3
milhões de milhões em hipotecas podres
Fannie Mae e Freddie Mac assumidos dentro
do balanço do governo, e os US$2 milhões de
milhões de swaps "dinheiro-por-lixo" ("cash-
for-trash") do Federal Reserve).
Isto está a ser ditado por mandatários
financeiros eufemizados como tecnocratas.
Designados pelos lobbystas credores, o seu
papel é apenas calcular quanto desemprego e
depressão é preciso para extorquir um
excedente a fim de pagar credores por dívidas
agora na contabilidade. O que torna este
cálculo auto-derrotante é o facto de que a
contracção económica – deflação da dívida –
torna o fardo da dívida ainda mais impagável.
Nem bancos nem autoridades públicos (ou
académicos da corrente principal, a propósito)
calcularam a capacidade realista da economia
para pagar – isto é, para pagar sem contrair
a economia. Através dos seus media e dos
seus think tanks, eles convenceram
populações que o meio de ficarem ricos mais
rapidamente é tomar dinheiro emprestado
para comprar imobiliário, acções e títulos a
aumentarem de preço – por serem
inflacionados pelo crédito bancário – e
reverterem a tributação progressiva da riqueza
do século passado.
Para colocar as coisas mais directamente, o
resultado tem sido teoria económica lixo. O
seu objectivo é desactivar limitações e
inspecções públicas, comutando o poder de
planeamento para as mãos da alta finança
sob a presunção de que esta é mais eficiente
do que a regulação pública. Acusa-se o
planeamento e a tributação do governo de
serem "a estrada da servidão", como se os
"mercados livres" controlados por banqueiros
com liberdade de movimento para actuarem
imprudentemente não fosse planear em favor
de interesses especiais por caminhos que são
oligárquicos, não democráticos. Dizem aos
governos para pagar salvamentos de dívidas
assumidas não para defender países em
guerras militares, como em tempos passados,
mas para beneficiar a camada mais rica da
população através da transferência das suas
perdas para os contribuintes.
O fracasso em tomar em consideração os
desejos dos eleitores deixa as resultantes
dívidas nacionais em terreno politicamente, e
mesmo legalmente, instável. Dívidas impostas
por decreto, por governos ou agências
financeiras estrangeiras diante de forte
oposição popular podem ser tão frágeis como
aquelas dos Habsburgos e outros déspotas
em épocas passadas. Na falta de validação
popular, elas podem morrer com o regime que
as contraiu. Novos governos podem actuar
democraticamente para subordinar a banca e
o sector financeiro a fim de servirem a
economia, não o inverso.
No mínimo, eles podem procurar pagar
através da reintrodução da tributação
progressiva da riqueza e do rendimento,
comutando o fardo fiscal para a riqueza e
propriedade rentista. A re-regulamentação da
banca e providenciar uma opção pública para
serviços de crédito e banca renovariam o
programa social-democrata que parecia bem
encaminhado um século atrás.
A Islândia e a Argentina são os exemplos
mais recentes, mas também se pode recordar
a moratória das dívidas de armas Inter-
Aliados e das reparações alemãs em 1931.
Um princípio matemático básico, e também
político, está em acção: Dívidas que não
podem ser pagas, não o serão.

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O que é o Estado

-Por Partido de Reedificação da Ordem Nacional

Quando uma criança nasce, ela não tem como cuidar de si mesma. Se não houvesse a família, ela sobreviveria poucas horas - a família surgiu na história da humanidade para ser a primeira instância em defesa da vida do ser humano.  A criança será o futuro cidadão se receber ao longo da infância alimento, educação, defesa contra o calor, contra a chuva, contra as doenças, etc.

Mais à frente, já um cidadão, para viver em sociedade precisa trabalhar, sair à rua sem risco de ser assaltado ou assassinado, ter água potável, ter um local para morar e se defender das intempéries; precisará de regras de convivência que definam muito bem os seus direitos e deveres.

Imagine que um povo inimigo invada a sua terra, queime as colheitas, mate o seu pai, estupre sua mãe, mate todos os vizinhos, tome sua casa, etc.  Quem vai defendê-lo? Tem que haver uma organização capacitada para enfrentar situações como essa - surge a necessidade das Forças Armadas.  O Estado surge então como o Poder Institucionalizado, a serviço da sociedade, senão não é um Estado Legítimo.

Sintetizando:

O Estado pressupõe um povo, um território e um poder originário de mando, o Poder Constituinte.  Deve existir e atuar de modo soberano, sempre em defesa dos interesses e das necessidades de seu povo.

Como deve agir o Estado?

Tendo em vista suas amplas e profundas responsabilidades, o Estado deve agir, sempre que necessário, como órgão interventor
restabelecendo a Ordem, a Justiça, a Igualdade de oportunidades e o direito ao Trabalho,à Moradia, à Educação, à Saúde, aos Transportes e à Sadia Necessidade de Criação de Riquezas - intervindo, se necessário, na produção e na Economia como um todo.

Ou seja, sem isso aí cidadania é pura conversa fiada!

Sem nenhuma dúvida!

Mas, se o Estado serve para tudo isso, por que não estamos vendo isso no Brasil?

Porque o Estado que aí está é fraco, inerte, ilegítimo, sem nenhuma função social - é inimigo do povo.

Este Estado, na verdade, não é soberano, ele obedece a um poder infinitamente maior, o Sistema Financeiro Internacional, que impõe suas regras à maioria das nações.

Esclarecimento: O Estado de que se está falando é o Estado-Nação (Brasil), que não deve ser confundido com o Estado Membro da Federação (Rio de Janeiro, São Paulo, etc.)

Por que os governos obedecem ao Sistema Financeiro Internacional?

Porque, para chegarem a ser governo, fizeram acordos, receberam importâncias fabulosas de legítimos representantes do Sistema
Financeiro Internacional.

E qual é o interesse, então, do Sistema Financeiro Internacional e dos Globalistas?

É destruir o Estado-Nação - destruído o Estado-Nação, não haverá mais quem defenda o que é patrimônio nacional. Assim, as
grandes riquezas da nossa terra - a água, o subsolo, as fontes de energia, etc, etc, etc -que nos fazem o país mais rico do mundo,
passarão as mãos de grupos representantes dos países ditos ricos, que, na verdade, estão em situação desesperadora, porque não têm como enfrentar as grandes necessidades do próximo século.

O senhor quer dizer com isso que o Brasil é muito importante para eles?

Sem dúvida, sem as riquezas do Brasil, não há futuro para os países do primeiro mundo. Por isso o Brasil é muito importante para eles.

O que não tem nenhuma importância para eles é o povo brasileiro.

Já não existe um consenso mundial que o Estado moderno não deve intervir em nada? , que tudo deve ser entregue às forças livres do mercado, fundamentalmente as estrangeiras, que deve haver liberdade absoluta?

Isto é uma grande mentira. A liberdade absoluta leva a um verdadeiro massacre dos mais fracos pelos mais fortes.Somente, e somente se,o Brasil fosse um país extremamente desenvolvido, e a indústria nacional fosse fortíssima,poderíamos,quem sabe,falar em "concorrência livre".

Na verdade, só o Estado tem força e, por ser responsabilidade sua, tem o interesse para intervir na Economia a favor dos mais
fracos, porque só o Estado, antes do lucro, está preocupado com o bem-estar do seu povo.

Esta é a questão central de todos os grandes problemas nacionais

O Estado liberautonomo-nem socialismo nem liberalismo

«A História política, económica e social do Ocidente nestes dois últimos séculos encontra-se largamente dominada por uma questão maior: a do papel do Estado. Os países  oscilam do liberalismo ao socialismo, ou inversamente, em idas e vindas que traduzem a incapacidade, não de resolver mas de dominar esta questão primordial. A sedução exercida pelo marxismo e pelo socialismo estatista sobre as opiniões ocidentais até estes últimos anos explica-se em parte pela convicção, largamente partilhada, que não existiria alternativa ao liberalismo senão o estatismo. Os defensores da democracia pluralista inquietam-se por ver o desenvolvimento dos “direitos-crédito” gerar o dirigismo e colocar em causa, inexoravelmente, os “direitos-liberdade” que se procuravam concretizar. A ampliação do Estado-providência deixa acreditar num processo fatal tendendo progressivamente a negar a própria democracia.
A ideia de liberautonomia situa-se nesta problemática inquietante. Ela procura ultrapassar a alternativa entre o liberalismo clássico e o socialismo centralizador, colocando diferentemente a questão político-social. Legitima filosoficamente os “direitos-liberdade” e regressa às fontes dos “direitos-adquiridos” que terão sido desviados da sua justificação primeira. Chega a um acordo viável entre uma política social e um Estado descentralizado, pela reunião paradoxal de duas renúncias: abandona o igualitarismo socialista em benefício da dignidade, e abandona o individualismo filosófico em benefício de uma sociedade estruturada e federada».

A ideia de subsidiariedade é estranha ao liberalismo filosófico porque é estranha ao individualismo e faz parte do pensamento organicista, em vez de considerar a humanidade como uma justaposição de indivíduos egoístas e libertos de toda a filiação coletiva, pensa os homens enquanto pessoas inseridas em comunidade orgânicas (famílias, corporações, cidades, sindicatos…).

Deste ponto de vista está muito afastada do individualismo que prevalece nas sociedades ocidentais, a sua adaptação nas nossas sociedades não se faz espontaneamente e necessita pelo menos de um regresso dos valores comunitários, isto é, da noção de deveres das pessoas face às comunidades nas quais estão inseridas.

A fim de permitir esta adaptação e de tomar em consideração o imperativo moderno do respeito pelas liberdades pessoais, é preciso, sem dúvida, completar o pensamento de Althusius, que é herdeiro do pensamento medieval, pela noção de autonomia da pessoa, esta última sendo então considerada como elemento de base da sociedade, titular de liberdades e de direitos mas também de deveres em relação às outras pessoas e às diferente comunidades nas quais se insere organicamente.

A ideia de subsidiariedade é igualmente estranha ao socialismo e ao Estado-providência porque confia nas pessoas e nas comunidades constitutivas do Estado no que concerne à produção e à distribuição de bens e serviços, por um lado, e para a organização destas comunidades por outro lado. Ignoramos  o igualitarismo marxista  (que associa a falsa ideia de igualdade natural à vontade estatista de igualizar as qualidades e os bens das pessoas), aprova a livre expressão dos talentos e recusa a ideia de um Estado que se substitui às pessoas, às famílias e a todos os corpos intermédios.

Para atenuar os desequilíbrios que podiam resultar do exercício das liberdades individuais e comunitárias, os pensadores subsidiaristas incluíram na sua doutrina o imperativo de solidariedade (entre as pessoas, de uma parte, entre as comunidades intra-estatais e as pessoas, de outra parte, entre as comunidades intra-estatais, por fim).

Subsidiariedade liberautonoma, absolutismo, jacobinismo, bolchevismo e liberalismo

O princípio de subsidiariedade opõe-se ao absolutismo monárquico (ou gerontocrático, oligárquico…) porque considera que a sociedade e as suas componentes associadas prevalecem sobre o Estado, que retira o seu poder destas últimas e que deve limitar a sua ação às únicas prerrogativas delegadas por elas. Assenta na ideia de que a sociedade precede cronologicamente o Estado, que este último é uma criação da sociedade com vista a satisfazer as suas insuficiências e não o contrário. Por outro lado, o princípio de subsidiariedade interdita a concentração de competências e de soberania somente no Estado.

O Estado subsidiário partilha a soberania e as competências com as diferentes componentes da sociedade.

Vimos que Althusius contestava a posição de Bodin, o teórico da monarquia absoluta; e teria com certeza contestado o poder jacobino que mais não fez que transferir a soberania absoluta do monarca para a nação cuja "vontade geral" é expressa pelos "representantes do povo". A ditadura da vontade geral  não comporta nenhuma delegação de competências nem nenhuma partilha de soberania, duzentos anos depois esta vontade geral tornou-se a vontade de uma medíocre oligarquia partidocrática muito ciosa das suas prerrogativas e segura de expressar a dita "vontade geral", para nossa maior desgraça.

O princípio de subsidiariedade é em total contradição com o bolchevismo, sob todas as suas formas, que fez de um partido comunista considerado vanguarda do proletariado,o único detentor da autoridade, da soberania e da competência; o pseudo-federalismo soviético nunca foi o quadro de uma devolução real de soberania ou de competência.

É também,em parte,estranho ao fascismo, que fez do Estado o centro da sociedade e que queria integrar a totalidade da sociedade no seu seio, mal deixando autonomia às famílias que eram, elas também, mobilizadas pelo Estado e para o Estado.

A prerrogativa popular e as organizações nacionais não são,nem nunca serão, objetos do Liberalismo.Seu antro está na macroeconomia e seus interesses nos capitais internacionais.